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Fui pôr o saco do lixo na rua, e o tritinado de um grilo chamou-me a atenção; estaria no quintal do outro lado da estrada? Mas o som era tão alto que me parecia mais próximo. Curiosa, fui-me aproximando da origem, e mal dei dois passos, ainda perto da soleira da minha porta, encontrei-o. O grilo estava alojado num minúsculo buraco do alcatrão recentemente colocado, e mal colocado, junto ao passeio. Perplexa, indaguei-me como teria ele aí ido parar, de que se alimentaria?
Lamentei a sorte do grilo naturalmente cantador. Enfiado num buraco negro, rugoso e pestilento ao invés do seu habitat natural, terra fresca com odores a ervas e flores silvestres. Perto do seu alimento. Longe dos bichinhos que habitam a terra como ele, e debaixo da iminente ameaça dos carros e pés humanos.
Especulo se este grilo escolheu o exílio, a natureza deixou de ser lugar seguro para o reino animal. E a fumaça, sobre as colinas que nos rodeiam, lembra-me que já nem aonde vivem humanos o refugio está garantido. Mas será talvez aqui o último abrigo. Eu sei que para o grilo este asilo tem os dias contados. E é triste.