Creio que pode ser contraditório, e até incompreensível, que sendo eu uma pessoa que gosta de viajar se desgoste de ver Portugal invadido por turistas. Mas é realmente assim que me sinto, e na raiz deste sentimento está outro que o justifica, que é eu não me sentir em Portugal em certas cidades. Há alguns anos bastava ir ao Porto, como me aconteceu, e subir de S.Bento aos Clérigos, para não ouvir ninguém a falar Português, de Portugal, o que já foi muito bizarro, porém, actualmente, acontece isto também em cidades secundárias, ou mais pequenas. É muito estranho, e não me parece natural.
Recentemente fomos ao Porto, e ao passear pela Baixa e atravessando S.Catarina, diz o meu marido: Parece que estou de férias no estrangeiro! Pois parecia. E essa sensação de sermos estrangeiros na nossa terra não é agradável, pelo contrário, é muito incomodava.
Fiquei também a saber nesse dia que o icónico edifício do Jornal de Notícias, jornal que o meu pai comprava sem falhar, todos os dias, tinha sido vendido, e ia ser transformado... num hotel! A portuense que me contou a novidade estava muito desgostosa, é um prédio histórico, dizia ela! Mas estão a fazer o mesmo com cafés, transformados naqueles restaurantes de hamburgers horríveis.
portanto, os hotéis e AL existem em todas as ruas, mas não chegam.
Saem os habitantes, por óbito ou despejo, e entram os turistas, transformando as cidades em parques temáticos, despojados da sua essência. Agora começo a compreender os italianos, quando fecham os negócios em Agosto para irem eles próprios de férias, estão-se manifestamente a borrifar para os turistas. E quando os tratam com indiferença, e frequentemente até com impaciência e irritação.
A economia dos países não pode ser feita às custas do bem-estar dos seus cidadãos; a qualidade de vida dos portugueses que moram nos grandes centros turísticos baixou drasticamente, como me contam os amigos e familiares que vivem no Porto. Evitam ir à Baixa, e deixam de frequentar espaços que sempre foram deles. Os turistas tomaram conta de tudo.
E depois, ainda me pergunto, de quanto desta riqueza gerada por este turismo descontrolado fica efectivamente no país; os investidores são estrangeiros, na sua maioria, e os trabalhadores ficam com as migalhas. Há cerca de 30 anos, quando trabalhei em hotelaria, os funcionários mantinham-se a trabalhar tanto na estação-alta, como na baixa, actualmente muitos deles são dispensados na estação-baixa. E vivem de quê, entretanto? Do subsídio do Instituto de Emprego? se tiverem direito sim, caso contrário terão que encontrar outro trabalho, ou algum biscate.
Em suma, os locais ficam sem casas, relegados para periferias cada vez mais distantes, os que permanecem sobretudo nas localizações mais turísticas são incomodados na base diária, por turistas ruidosos, os preços sobem de acordo com os vencimentos dos estrangeiros, as ruas sobre lotadas causam congestionamentos e stress, tudo porque o mundo parece ter descoberto Portugal.
Para um português fazer férias no Verão, em Portugal, ficou muito complicado, para não dizer insustentável. O nosso país está cada vez mais adequado para os estrangeiros.
Agosto nunca foi um mês que eu gostasse particularmente, mas actualmente tornou-se pior ainda. O melhor sítio para estar, sobretudo aos fins-de-semana, é mesmo em casa. Felizmente, tenho o meu pequeno paraíso, a minha ilha, como alguém me disse recentemente. Que sorte a minha.