Certa vez, tentava consertar uma peça partida no wc de serviço, quando o meu filho, que teria uns 3 anos na altura, se aproximou e perguntou:
-Quem partiu isso, mãe?
Ao que eu respondi muito irritada, referindo-me ao trolha:
-Foi um burro, Duarte!
O interesse dele redobrou:
- Foi? Com um coice? E como é que ele entrou aqui? Deixas-te a porta de casa aberta?
A minha irritação desapareceu subitamente de tal forma achei divertida e inesperada a pergunta dele. Um adulto saberia que eu só podia estar a referir-me a alguém mas uma criança acreditou que realmente um burro tivesse entrado ali!
É comum referirmo-nos à 3ª idade como a 2ª infância, no entanto sem nunca ter reflectido realmente sobre isso, pensei que a expressão fizesse alusão à dependência dos idosos, às “patetices” que muitas vezes fazem e dizem por esquecimento. É com alguma vergonha que o confesso, mas era assim que pensava. Até há poucos dias quando vi um programa sobre burlas feitas a idosos. Fiquei perplexa com a singeleza das manigâncias, eu juraria que nunca, jamais, alguém cairia no conto do vigário com histórias tão mal contadas! No entanto, aqueles idosos caíram. E de repente compreendi; a 2ª infância refere-se à ingenuidade, à abertura aos outros, à entrega sem maldade, próprias da criança. Por alguma razão no fim da nossa vida, voltamos a ser como éramos em crianças. Lembrei-me dos idosos da Keila, de como choraram de decepção durante dias por uma alegria frustrada. Então, compreendi-os verdadeiramente.
Vivemos num mundo que se enternece muito facilmente com imagens de bebés e crianças, que se mostram e passeiam orgulhosamente, enquanto escondemos os idosos e nos envergonhamos deles. Quem nunca reparou na empatia entre crianças e idosos? Afinal, não é tudo infância?!E eles sabem. Mas, nós não!
Bom fim semana!