segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Recebi uma carta, perdida no tempo.


Veio de Novembro de 1959 e estava na caixa da colecção de selos do meu pai. Ao mexer na caixa pela primeira vez encontrei-a, solitária entre selos. Não era dirigida a mim, mas como foi escrita ao meu pai e ele já cá não está, li-a sem pedir autorização. Ao desdobra-la caiu a cópia da resposta que o meu pai escrevera e lembrei-me de como ele era impecavelmente organizado.
Li as cartas várias vezes, pois algumas letras eram difíceis de decifrar e na cópia do meu pai, dactilografada, a tinta começava a desaparecer. Também porque aquelas informações eram peças de um puzzle que eu julgava ter feito há muitos anos e portanto algo não encaixava.

Não batia certo porque o puzzle que fiz há anos atrás foi construído com suposições e informações exteriores. Estas eram as peças verdadeiras e originais, que vinham mostrar-me um cenário novo e inesperado. Antes destas cartas, eu, sentindo-me Senhora da Verdade, tive uma discussão monumental com alguém que eu julguei mal, em defesa do meu pai. Só me posso desculpar com a raiva, revolta e dor, que a morte do meu pai me causara dias antes. Espero que essa pessoa tenha sido perspicaz e benevolente o suficiente para comigo, para ter compreendido a minha injustiça. Porque agora também é tarde, para nós.

Com a carta dobrada nas mãos, pensei em como nunca somos conhecedores totais das histórias alheias e por conseguinte, corremos um enorme risco ao imiscuir-nos, mesmo com a melhor das intenções. Pior ainda se ninguém nos pediu que o fizéssemos.
Por vezes tenho uma dúvida, uma pergunta que gostaria de fazer ao meu pai. Questões muito particulares, que só ele me poderia responder. Acontece muito frequentemente, como acontecia em vida. E fico sempre com pena. Desta vez, sem perguntar, obtive uma resposta. Irónico, não é? Que uma carta venha através do tempo estilhaçar uma verdade. Ou uma mentira.

Tenha uma óptima semana!