sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Hanno e a Ordem do Elefante Branco




No palácio Amalienborg, que também é a residência da família real dinamarquesa, notamos entre as diversas comendas uma do Elefante Branco. Primeiro estranhamos; o que faz o elefante na Dinamarca? Elefante branco? Nem a funcionária daquela ala do museu soube responder às nossas questões, excepto dizer que era antiga, do séc.XVI. Então começamos a relacionar algumas coisas, mais precisamente com a história de Hanno. Este foi o elefante vedeta, que fazia parte da embaixada portuguesa, chefiada por Tristão da Cunha, enviada ao Papa no séc.XVI. A parada foi comentada em toda a Europa pelo seu exotismo, opulência e singularidade.

D. Manuel tê-lo-ia recebido como um presente do rei de Cochim, ou pedido a Afonso de Albuquerque o seu Governador da Índia, para comprá-lo. Conta-se que Hanno era de cor branca, e chegou numa nau, enviado de Lisboa a Roma em 1514, com cerca de quatro anos de idade.
A sua chegada foi comemorada na poesia e nas belas-artes.

Para a mesma ocasião viria um rinoceronte, que seria retratado por Albrecht Dürer em uma famosíssima xilografia, conhecida como Rinoceronte de Dürer. Apesar de nunca o ter visto, o artista baseara-se numa descrição extremamente precisa do animal. O barco com o rinoceronte terá naufragado ao mesmo tempo que Hanno chegava de Lisboa.
Na embaixada manuelina, que atravessou a cidade para deleite dos romanos, vinham também dois leopardos, uma pantera, alguns papagaios, perus raros e cavalos indianos. Hanno carregava um palanque de prata no seu dorso, em forma de castelo, contendo um cofre com os presentes reais, entre os quais paramentos bordados com pérolas e pedras preciosas, e moedas de ouro cunhadas para a ocasião.
O papa recebeu o cortejo no Castelo de Santo Ângelo. O elefante ajoelhou-se três vezes em sinal de reverência e depois, obedecendo a um aceno do seu mahout (tratador) indiano, aspirou a água de um balde com a tromba e espirrou-a sobre a multidão e os cardeais.


Inicialmente Hanno foi mantido em um pátio belvedere, mas depois passou para um edifício especialmente construído para o efeito, entre a Basílica de São Pedro e o Palácio Apostólico, perto de Borgo Sant'Angelo.
O elefante tornou-se num favorito da corte papal, alegadamente fazendo habilidades para o seu divertimento e participando em procissões. Rafael e Pietro Aretino desenhavam o fascinante animal, que custava cem ducados por ano aos cofres papais. Os cronistas da época falavam dele como sendo extraordinariamente inteligente, que dançava e lançava água pela tromba, entre outras brincadeiras.

Dois anos depois de chegar a Roma, Hanno adoeceu subitamente com angina, devido ao clima húmido da cidade. Trataram-no com um purgante mas morreu em 8 de Junho de 1516, com o papa ao seu lado, e foi sepultado no Cortile del Belvedere.

Raffaello Santi criou um fresco memorial (já não existente), e o próprio papa compôs o epitáfio, que Francisco de Holanda reproduziu no seu caderno de anotações.*


Relativamente à Ordem do Elefante Branco** (em dinamarquês: Elefantordenen) é a mais alta ordem da Dinamarca. Tem origens no século XV, mas existe oficialmente desde 1693, e desde o estabelecimento da monarquia constitucional em 1849, é quase exclusivamente concedida à realeza e chefes de Estado.
Contudo, a Ordem do Elefante Branco pode ser localizada por volta  de 1460, quando Christian I, com a aprovação do Papa, estabeleceu "A Sociedade da Mãe de Deus"***.  
O emblema da sociedade era um medalhão da Virgem Maria e o Menino Jesus numa torre, numa cadeia de elefantes. A página oficial da casa real afirma desconhecer a razão da escolha do elefante.  

Portanto, à partida há fortes coincidências, elefante branco, torre em cima do elefante, ricamente decorado, parece mesmo que a comenda foi inspirada em Hanno. Além disso, os elefantes eram raros na Europa ( suspeito que Hanno terá sido mesmo o 1º a cá chegar), e os dinamarqueses nem sequer estiveram envolvidos nos Descobrimentos, muito menos, tão precocemente.
Existe porém a discrepância na data.
Uma coisa é certa, mantém-se um certo mistério à volta do emblema da Ordem, e toda esta história me fascina, por suspeitar que está de algum modo interligada.  

Fontes:
* Wikipedia
** Wikipedia
*** Kongehuset