segunda-feira, 23 de março de 2020

Dica de Leitura: O Dia dos Prodígios

Via
É o primeiro livro da Lídia Jorge que leio, resultado da influência declarada das suas crónicas na Antena2. Se gostei das crónicas, talvez gostasse da sua literatura, pensei eu, muito embora já me tenha enganado por esse raciocínio, e não ter gostado nada do livro, de um autor de cujo blogue gosto bastante. Felizmente, desta feita, não foi o caso; gostei mesmo. Apesar dos pontos finais em abundância, que mais parecem ter sido atirados para as páginas como se polvilhassem uma travessa de filhoses, interrompendo frases e diálogos, fazendo a vez de vírgulas, parágrafos e travessões. É como se fosse uma leitura aos soluços, e pelo menos, para mim, a leitura quer-se fluída.
Apesar disso, e dos regionalismos, que uma minhota não tem obrigação de conhecer, reconheço a importância da preservação dos dialectos regionais, e já agora, apesar de algumas palavras mais "populares", digamos, que não fazem de todo o meu estilo, e que até na escrita me repugnam um pouco. Mas enfim, a população retratada não é propriamente erudita, portanto, é assim que falam.

Ora sucede que na aldeia de Maninhos, onde todos os dias são iguais, acontece um episódio inexplicável, e a partir daí os dias passam a ser, pelo menos um pouco, diferentes; há uma tasca, aonde param os clientes habituais, as línguas venenosas da povoação, há muitos habitantes velhos, que vivem entre o passado e o presente, como que entre sonhos, e a beleza da aldeia, uma rapariga com origens pouco recomendáveis. Há personagens que entram e saem, e recuos ao passado, e visões do futuro, porque como em todas as aldeias do interior, de outrora, as informações chegam, muitas vezes por via mística. 
Em todo este emaranhado de personagens e histórias passadas existe um fio condutor que as liga, e um retrato íntimo de cada um, muito honesto e profundo, a que o leitor não poderá ficar indiferente, pela sua humanidade e delicadeza.

Título: O Dia dos Prodígios
Autora: Lídia Jorge
Editora: Publicações Dom Quixote
Nr de Pág. 223