quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Dependências


Via TheTelegraph
Uma reportagem na televisão acompanhou a família de uma jovem que se assumia inseparável do seu Iphone, chamando-lhe inclusivamente - meu melhor amigo. A mãe assumiu que lá em casa cada membro da família estaria normalmente numa divisão diferente, cada um com o seu aparelho, e que através dele comunicavam, se necessário. Assumiu também que a comunicação entre a família era praticamente inexistente.

Entretanto, li um artigo de uma mãe no qual admitia que após ter o telemóvel avariado se apercebeu (depois de 2-3 dias a ressacar), como estava dependente dele, interrompendo qualquer actividade que estivesse a fazer com a filha, para responder às solicitações que o aparelho emitia.

Este estudo do ISPA  fornece agora dados muito concretos e preocupantes - 73% dos jovens portugueses apresentam sintomas de viciação na internet, sendo  13% um caso severo, revelando sinais como dores de cabeça, irritabilidade e por vezes agressividade quando frustrados; por sinal, cerca de 52% dos jovens tem noção e assume essa dependência.

Enquanto pais e educadores temos todos a noção da dependência mas... estaremos realmente preocupados e empenhados numa viragem?
Muitos pais e educadores estão igualmente viciados nas novas tecnologias, postando frequentemente no FB fotos e factos, pensamentos e ilustrações, tão desejosos de likes, como os filhos, e aspirando igualmente a números impressionantes de "amigos".

Em qualquer local se encontram grupos, de família ou amigos, cada um com o seu aparelho, teclando muito mais do que conversando. Seja num restaurante, num jardim, ou caminhando na rua.
E a situação parece ser conveniente para todos. E por que não seria, se em casa se passa o mesmo?

Há pelo menos algumas horas do dia em que as famílias se encontram, que normalmente coincidem com as refeições, sendo que esse tempo conjunto deveria ser assumido como exclusivo para a família, e aproveitado para comunicar.
Desligar todos os aparelhos e desligarmo-nos deles. Desfrutar desse par de horas para nos inteirarmos de como todos passaram o dia, do que aconteceu, para desabafar, pedir conselhos e dar orientações, ou simplesmente assumir um estado de espírito. É assim que se constroem os laços entre as pessoas, através da comunicação directa que estabelecemos com amigos e família.

Não acontecendo isto na vida real, acaba por ser escancarado nos ecrãs de desconhecidos - ah, perdão, "de amigos".

Mais uma vez, e como se costuma dizer: "o exemplo vem de cima". É necessário ter moral para exigir determinados comportamentos dos filhos. Se a prática for comum é mais fácil aceitá-la, ainda que saibamos que fácil nunca será, porque a sociedade está empenhada no contrário;  senão, vejamos mais esta facilidade, uma via reservada exclusivamente a utilizadores de telemóveis. Começou na China, mas quem não acredita que depressa será replicada por todo o lado?

Esta é, de facto, uma dependência a que o Mundo abre alas; a luta para reverter a situação está a desfavor dos pais e educadores, mas creio que se formos consistentes e igualmente perseverantes, poderemos ensinar, pelo menos, que a relação homem-máquina pode ser mais equilibrada. E mais saudável.