terça-feira, 20 de novembro de 2018

Casados pela rua da amargura

 
Via

Desde a primeira vez que vi "Casamento à primeira vista", versão australiana e original, que este reality show me chamou muito a atenção. Por curiosidade vi muitos episódios, inclusive da versão inglesa, espanhola e agora da portuguesa. Como digo ao meu filho, quando se espanta por eu perder tempo com este tipo de programas, o meu interesse é psicológico, antropológico e social; as coisas que aprendemos sobre o comportamento humano e sobre o estado em que a sociedade se encontra,  é de um manancial quase ilimitado. 

Com a ideia de que agora as pessoas se conhecem pelas redes sociais, namoram, apaixonam-se e casam, não sendo necessário aquele teste do "olho no olho", nem aquela coisa da "química de pele", o programa propõe-se, sob a égide da "ciência" a encontrar os pares perfeitos. 
Apoiado no conhecimento de diversos profissionais, sexólogos, coachs de comunicação, psicólogos e neuro-não-sei-quê, com ajuda de eléctrodos e testes das mais refinadas questões, os casais com altas compatibilidades são formados e atirados para os braços um do outro, agarrando-se a eles como náufragos, ou... não! 
Por todos os finais de programas destas séries que vi, o sucesso destes casamentos é raríssimo, sendo a percentagem dos que permanecem casados uma vergonha para a "ciência", e um fracasso colossal para o programa. De facto, na vida real, o amor à primeira vista acontece, ainda que raramente, mas para que funcione tem que haver, efectivamente, essa troca física de olhares.

Parece-me que ignoram o evidente, que não é a compatibilidade que forma casais; se a compatibilidade fosse assim tão forte quase todas as mulheres estariam casadas com mulheres! E que ninguém consegue forçar-se a gostar do outro, por muito que lhe reconheça qualidades e gostos idênticos. Apreciar, sim, mas amar não, sentir-se atraído também não. Há algo na esfera do amor que vai para além do compreensível, e daquilo que a ciência pode compreender e explicar. Até a ciência tem limites. Daí que este falhanço, partindo de uma premissa equivocada, seja mais do que expectável e compreendido. Todavia, não há problema de maior porque no final do programa os casais se vão divorciando sem dramas. E para mim, esta questão é que é um autêntico drama, considerando que Portugal é líder dos divórcios na Europa, que venha um programa tratar do casamento desta forma ligeira e brejeira, vulgarizando-o, e retirando-lhe a já pouca  formalidade e importância que lhe resta. 
Mas é esta a televisão que se faz e temos, perdeu o papel educativo que promove valores para o desenvolvimento ético da sociedade, e faz exactamente o contrário. 
Sendo assim, não lamento nada, que cada vez mais, a televisão perca espectadores.