quarta-feira, 23 de novembro de 2022

Ninho

Os meus filhos adoram vir a casa aos fins-de-semana, aliás, se por algum motivo as aulas de sexta-feira forem canceladas ou adiadas antecipam de imediato a vinda. E a verdade é que eu gosto que venham. Não que estejam mal fora de casa, não, também se sentem muito bem na outra casa, e eu também gosto muito disso, mas adoram voltar a casa,  aos seus quartos, às suas coisas, aos gatos, às comidinhas "da hora", como eles referem, ao aconchego do lar, porque aqui é que continua a ser lar. 

Porém, nada disso seria apreciado e nem por isso apenas voltariam se não fosse a atmosfera que vivem em casa como família. É a família que faz o lar, e por isso esse pode ser em qualquer sítio. 

Por ser tão normal para nós que assim seja, quando os meus filhos me contam que este ou aquele amigo passa semanas sem ir a casa, ou que vai num dia e volta no outro, sinto uma grande pena porque isso me revela um desligamento familiar. O Duarte tem até um amigo muito próximo que já comentou: Quando começar a trabalhar vou para longe, e vou ser daqueles que vai visitar os pais 2 vezes no ano, no Natal e nas férias". E ao meu "Ai, que pena...!" tão consternado, responde o Duarte: Não me admira, a mãe dele não fala, só berra! Parece que quando jogam ouvem a mãe dele, como ruído de fundo. E eu também compreendo que não se tenha vontade de regressar a uma casa onde não nos falam com voz calma, mesmo quando reclamam, ou que reclamam muito, haverá assim tanta coisa errada para fazer zangar?! Até pode haver, quando os pais exigem perfeição dos filhos, quando nada os contenta, quando continuamente elevam a fasquia, quando não gostam de passar tempo com os filhos, de conversar com eles e saber como decorreu a semana; quando não abraçam, não aconchegam os cobertores, e dão beijinho de boa-noite. 

Há anos que eu digo que a intimidade com os filhos se constrói desde o início, desde muito cedo. E se faz com presença, amor, assertividade e justiça. Se não se constrói essa ligação na infância, torna-se muito difícil recuperá-la, e creio que tanto pais como filhos, por nunca terem vivido outra coisa, acham tudo normal e não enxergam sequer necessidade de mudanças, de melhorias. Fica apenas o sentimento, o desligamento, uma certa indiferença, até um certo desconforto e mau-estar, por isso começam a evitar as idas a casa.

Na minha geração ainda existia aquela expressão "enquanto estiveres debaixo do meu telhado...", embora eu nunca a tenha ouvido, sempre a achei horrível, era uma ameaça e um aviso: esta casa é minha! Logo não é tua. 

É tão bom sentir que existe um sítio no mundo que é garantidamente nosso! Onde somos bem-vindos, acolhidos, protegidos, em caso de necessidade. Mesmo quando saímos definitivamente de casa, para construir a nossa, com a crença de que será para sempre. É tão reconfortante saber que existe um porto-seguro, não importa o quê.

Eu já disse aos meus filhos que enquanto eu tiver casa também será deles, a entrada é franca, serão sempre recebidos de braços abertos. Isto também é amor incondicional.

Lamento imenso que muitos filhos não possam sentir o mesmo que os meus sentem. Tenho a impressão que de que já sofrem uma espécie de orfandade, em vida dos progenitores. Acho tudo isso um desperdício e muito triste, para ambas as partes.