quarta-feira, 8 de março de 2023

Dica de Leitura: O silêncio das mulheres

Adorei ler a Ilíada na Faculdade, portanto toda a literatura que me surge tendo-a como inspiração me atraí, e embora se possa pensar que é mais do mesmo, não é, sendo que este livro invoca a memória feminina na guerra de Tróia, pelo que nisso é mesmo muito diferente. 

Pat Barker é uma autora inglesa, de ficção, diversas vezes premiada; nasceu em 1943, de mãe solteira, numa família da classe trabalhadora, que passou por imensas dificuldades. Estudou História Internacional, e a sua primeira obra, Union Street, foi publicada em 1982, e adaptada ao cinema, em Hollywood. A lista dos livros publicados é longa, este é de 2018, e ganhou o Women's Prize for Ficction. 

O ditado "O silencio assenta bem às mulheres" indica desde logo que o sexo feminino não tem palavra a dizer nesta história, contudo, as mulheres vivem-na, sentem-na, pensam-na.
 
A narradora é Briseida, a jovem rainha do Lirnesso, casada com Minos, que após a vitória dos troianos é oferecida pelos soldados a Aquiles, como troféu, sendo habitualmente esse o destino das aristocratas, acabarem, como por sorte, amantes dos altos escalões. Arrasada pela morte da sua família e destruição do seu reino, Briseida tem que servir o seu novo senhor, sendo esse o responsável por todo o seu infortúnio. Enquanto se adapta ao acampamento, Briseida vai tomando conhecimento com outras mulheres, também ex-senhoras de diversas origens, agora escravas dos seus captores, e dos próprios troianos, entre os quais o hermético Aquiles. 
Briseida junta-e às mulheres nas actividades do acampamento, servindo à mesa, na tenda-hospital, nos teares, que nunca param, e obviamente, na cama de Aquiles. A ambiguidade da situação é cruel, os seus captores podem ser também os seus salvadores, e frequentemente os pais dos seus filhos.
O retrato de Aquiles, meio-homem meio-Deus pela sua origem divina, não lhe sai beneficiado, e ainda que Heitor seja apenas aludido, permanece o meu herói favorito da História de Tróia, cuja morte me custa sempre a aceitar. Em todas as narrativas.  

Pela voz de Briseida, ficamos a conhecer a vida militar, religiosa, e amorosa das personagens cantadas por Homero. A crueldade é extensiva a todas as áreas da vida, cujo valor se localiza muito distante daquele que lhe atribuímos actualmente. 

Gostei do livro, aporta outra perspectiva, oferecendo a versão dos mais fracos na guerra, embora no caso, das mais fortes entre as mais fracas. É porém uma narrativa muito actual, as mulheres e crianças continuam a ser as vítimas de guerras que não começaram nem queriam. 


Título: O silêncio das mulheres
Autora: Pat Barker
Editora: Quetzal, serpente emplumada
nr de págs: 379